Pra saudar o início do mês de Maio, o post de hoje trás algumas fotos da artista sueca Lina Scheynius.
"é a minha própria vida e as pessoas que fazem parte dela. Eu fotografo isso e mostro como um diário" revela Lina.
"Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento". Clarice Lispector
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Simples assim...
Acompanho seu trabalho há algum tempo e o que mais me chama atenção é a forma com que trabalha a intimidade e sensualidade, sem nenhum clichê, que salta aos olhos como algo sereno, leve e presente no cotidiano.
"Quem sabe se o que nós fizemos até agora é, simplesmente, supervalorizar a sensatez que, com frequência, é simples mediocridade?"
Ernesto Sabato
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Para mais fotos dá um conferes na página dela >>>> Lina Scheynius<<<
Aos domingos, a família ia ao cais do porto espiar os navios. Debruçavam-se na murada, e se o pai vivesse talvez ainda tivesse diante dos olhos a água oleosa, de tal modo ele fixava a água oleosa.
As filhas se inquietavam obscuramente, chamavam-no para ver coisa melhor: olhe os navios, papai!, ensinavam-lhe elas inquietas. Quando escurecia, a cidade iluminada se tornava uma grande metrópole com banquinhos altos e giratórios em cada bar. A filha menor quis se sentar num dos bancos, o pai achou graça. E isso era alegre. Ela então fez mais graça e isto já não era tão alegre. Para beber, escolheu uma coisa que não fosse cara, se bem que o banco giratório encarecesse tudo.
A família, de pé, esperava. A tímida e voraz curiosidade pela alegria. Foi quando conheceu ovomaltine de bar, nunca antes tal grosso luxo em copo alto, mais alteado pela espuma, o banco alto e incerto,the top of the world.
Todos esperando. Lutou desde o princípio contra o enjôo mas foi até o fim, a responsabilidade perplexa da escolha infeliz, forçando-se a gostar do que deve ser gostado, desde então misturando, à mínima excelência de seu caráter, uma indecisão de coelho.
Também a desconfiança assustada de queovomaltine é bom, quem não presta sou eu. Mentiu que era ótimo porque de pé eles assistiam à experiência da felicidade cara: dela dependia que eles acreditassem ou não num mundo melhor? Mas tudo isso era rodeado pelo pai, e ela estava bem dentro dessa pequena terra na qual caminhar de mão dada era a família.
De volta o pai disse: mesmo sem termos feito nada, gastamos tanto. Antes de adormecer, na cama, no escuro. Pela janela, no muro branco: a sombra gigantesca e flutuante dos ramos, como se de uma árvore enorme, que na verdade não existia no pátio, só existia um magro arbusto; ou era sombra da lua.
Domingo foi sempre aquela noite imensa que gerou todos os outros domingos e gerou navios cargueiros e gerou água oleosa e gerou leite com espuma e gerou a lua e gerou a sombra gigantesca de uma árvore pequena.
>>Domingo, antes de dormir
Clarice Lispector<<
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Do dia: "¿Dime quién camina, cuando se puede volar?" (Gitana - Shakira)
Esses dias, depois de umas estripulias em que machuquei o joelho, passei a andar mancando.
E andando por ai comecei a perceber o quanto existem pessoas mancando nesse mundo!
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Sério, era algo que não havia reparado antes...
Entre as opções para explicar tanta mancada, elegi duas principais _ das duas um (ou as duas!):
1-Mancando, pé ante pé, passei a andar bem mais devagar, então com isso passei também a observar mais as coisas a minha volta, olhar com mais calma o mundo...
2-Mancando, pé ante pé, passei a reconhecer outros que também mancavam, algo que até então não significava nada, passou a ser uma identificação. Tomou outro significado, como algo que era comum, familiar. Com o outro, que até então era estranho, passei a partilhar algo...
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Não sei, mas nessa história toda, uma conversa me chamou atenção:
Indo para a rodoviária com a mochila de acampamento nas costas e outra na frente, mancando... observo um senhor que vinha em minha direção, mancando... vamos nos olhando... cada um no seu ritmo, mancando...
Ao se aproximar, depois dele me olhar dos pés a cabeça, me disse:
"Parabéns grande! Mesmo manco você é mochileiro! Oia que tah representando a categoria!"...
Minha primeira vontade foi cair na gargalhada e tentar explicar que não era manco, apesar de estar!... Mas me contive!
"Já que sou, o jeito é ser"...
Dei apenas um sorriso e disse: "Pois é, nessa vida não nos pode é faltar coragem!"
Em alguns minutos me disse que tinha sofrido um acidente quanto criança e que isso o teria feito ficar com alguns centímetros a menos na perna direita, ...
Hoje trabalhava como reciclador na rua.
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Toda essa história me lembrou Macabéia, aquela da Hora da Estrela, "já que sou, o jeito é ser" dizia ela... sem questionar, apenas era!
Sabe aquele dia que bate uma saudade de não sei o que?!?! Saudades... nem sei o que é!
Mas é saudades da vida em Córdoba, dos amores distantes, de um apanhado de coisas, no fundo, #sepah, é até da saudade...
" Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida. "
Já dizia a senhoria Lispector.
Então que assim seja!
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Neste sábado rolou a sessão de fotos para a Formatura, posto uma aqui de quebra!!!
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Do dia: "Na bruma leve das paixões. Que vêm de dentro. Tu vens chegando. Prá brincar no meu quintal" (Anunciação - Alceu Valença)